2009-11-24

Os "nossos" poetas

NO âmbito do programa da u.c. de educação de adultos I foi proposto à turma do 2º ano, regime pós-laboral, um pequeno exercício de levantamento de literatura oral, para concretizar o estudo sobre património cultural.
Alguns grupos, na recolha de tradições, mezinhas, poesia popular, provérbios,rezas, recorreram a familiares e amigos. Muito bem!
Vou divulgar alguns desses poemas dos "nossos" poetas porque a maioria são familiares muito próximos dos alunos e alunas:


Luciano Viegas Trouchinho nasceu em 29 de Janeiro de 1936 em Marrocos. Muito pobre e quaisquer recursos económicos para tratar a sua doença aos seus 17 anos de idade, consegue um atestado de pobreza e 100$00 oferecidos pelos seus vizinhos, que o ajudam a migrar para Lisboa à procura de salvação. Sozinho e enquanto o corpo adoecia cada vez mais, tentava afastar o seu pensamento a escrever versos, conseguindo ainda angariar algum dinheiro para o seu tratamento.

Por causa de uma doença
Padecer na pobreza
É melhor por vezes morrer
Que assim viver na tristeza

Na flor da nossa idade
Ninguém devia adoecer
É melhor às vezes morrer
Que assim viver na Humanidade
Dizem ser uma realidade
Não possuir doença
É melhor morrer à nascença
Que assim tanto sofrer
Andar sempre a padecer
Por causa de uma doença

Um doente só com pensar
Na sua arruinosa situação
Arruína o coração
Por que o faz bem magoar
Não se pode melhorar
Porque vive na pobreza
Que no seu corpo existe
É uma coisa muito triste
Padecer na pobreza

Quando entrar uma doença
Muito tarda a sair
Para a gente possuir
É melhor morrer à nascença
Só o que um doente pensa
No seu triste padecer
Andar sempre a querer
Dessa maldita se salvar
Para uma delas nos atacar
É melhor às vezes morrer

Certas pessoas mimosas
Que no seu caminho vão seguindo
Saltando, gozando e rindo
Julgando ser orgulhosas
Dizem ser vaidosas
Por possuir certas riquezas
Mas surgem as tristezas
Que as fazem padecer
É melhor às vezes morrer
Que assim viver na tristeza.

*********************

Não quero quando morrer
Ir num caixão deitado
Para ninguém ficar a saber
Onde fui enterrado

Quero ir à electricidade
Para uma cova na serra
Para que em toda a terra
Que eu fui sepultado
Plantarem uma roseira
Que cresça ali a meu lado

Plantem também um lírio
Que significa martírio
Porque bastante passei
Pois isso que lhe ditei
É a pura da verdade
Para viver com lealdade
Temos de passar por santos
E por isso os encantos
Aparecem na serra
Outros aparecem na guerra
Pela sua valentia
Mas eu quando morrer um dia
Quero ir para baixo da terra

Mas não quero ir para o cemitério
Porque qualquer mistério
Que lá possa haver
Quero morrer num jardim
Pois eu quero enriquecer

Pelas suas lindas flores
Cada quais com suas cores
Faço venda a toda a gente
Cada molho 15 tostões
Vendendo flores e botões
Da campa de um inocente

Depois de estar completamente curado e sentindo-se mais forte, escreveu estes versos:

Numa noite de verão
Num campo desconhecido
Encontrei certo sujeito
Dentro de um saco metido

Era no mês de Agosto
No rigor do calor
Para procurar um amor
Pus-me a correr de gosto
Tinha já o meu rosto
Encarnado como pimentão
Pus-me a correr então
Nas terras mais modestas
Encontrei várias florestas
Numa noite de verão

Ao atravessar mata cerrada
Que era perfeita planície
Encontrei à superfície
A terra escavacada
E a olhar e sem ver nada
Procuro-me onde estou metido
Mas ainda como atrevido
Pus-me pela gruta a andar
O diabo fui encontrar
Num campo desconhecido

Era negro como o carvão
Com unhas grandes e rabo
Disse para comigo é o diabo
E pus-me em observação
Trazia cartas na mão
Um grande medalhão ao peito
E disse-me com brusco jeito
Vamos jogar uma cartada
E nessa terra malvada
Encontrei certo sujeito

A um joguinho que eu sei
Fomos jogar uma cartada
Dei a primeira trucada
E todas as vezes ganhei
Foi depois quando o fintei
Ao dizer-me seu atrevido
Você vai ser cozido
No inferno o vou devorar
Mas eu deitei-o a afogar
Dentro de um saco metido

Trabalho elaborado por:

Discentes:
Catarina Viegas, nº. 38000
Sara Guerreiro, nº. 33922

2 comentários:

A partilha é um tesouro! disse...

Sabe prof. Joca, sempre pedi ao meu pai para escrever os seus versos em papel, mas a resposta foi sempre a mesma: "não tenho cabeça para isso". Com esta recolha, ele ficou tão entusiasmado que parecia uma criança. Relembrou-se de alguns versos que já se tinha esquecido, dedicou-se com alma e coração e adorou a ideia. No fim ainda disse: "se não fosse eu, vocês não tinham conseguido". :-)
E agora até já diz que vai passar todos os seus versos para o papel. Escusado será dizer o quanto feliz estou. Esta recolha já deu frutos :-)
Ah...e até já marcou presença no encontro de poetas. Quem diria? E esta hein?

antonio Gallobar disse...

Excelente blog cultural, muitos parabens tenho adorado o que por aqui tenho lido e aprendido, muitos parabens,adorei naturalmente