2009-11-28

O meu contributo

Recordar é (re)viver...

O Algarve sempre foi uma região rica ao nível do seu património cultural que inclui tradições, mezinhas, poesia popular, provérbios, artesanato, acontecimentos festivos, festas populares. Infelizmente este património cultural não tem sido devidamente explorado. Veja-se a título de exemplo o “nosso” poeta mais carismático, o António Aleixo que, apesar de conhecidas algumas das suas quadras a nível nacional, aqui no Algarve a sua vida e obra não tem o reconhecimento que deveria ter. Veja-se a ausência da sua vida e obra nos currículos do ensino básico o que reflecte a ignorância manifestada por alunos do ensino superior sobre a sua obra. Em duas turmas do Curso de Educação Social, uma de regime diurno e uma de regime pós-laboral, a maioria dos alunos e alunas não conhecia quase nada da vida de António Aleixo e não eram capazes de dizer uma única quadra sua. Estranho! Este é um exemplo, mas poder-se-iam apontar muitos outros relativamente ao conhecimento da nossa tradição oral.
É urgente levantar esta cortina do esquecimento e dar visibilidade ao nosso património cultural, valorizá-lo e preservá-lo. Preservar a nossa cultura é preservar a nossa memória, é consolidar o nosso sentido de identidade, de pertença a uma comunidade, a uma região com a qual nos identificamos. Uma comunidade, uma região, sem património cultural, é um espaço territorial com gente sem referências. Gente sem referências, é gente sem memória, gente sem futuro.
Com o objectivo de viabilizar a salvaguarda desse património há que pesquisar, identificar, registar, divulgar, valorizar, porque se não o fizermos, poderemos não deixar uma memória escrita onde as futuras gerações se possam rever e orgulhar da “sua” identidade. A identidade de uma comunidade, de uma região será importante para a afirmação de valores morais, éticos e culturais. A nossa História deverá ser mantida na lembrança, passando de geração para geração, por forma, a ser respeitada, valorizada e mantida.


[Uma história da Tia Rita Engrácia (Furnazinhas, Castro Marim)]:

Havia dois rapazes que já há muito tempo que não se encontravam. Um dia encontraram-se e estiveram a falar um com o outro. A certa altura um deles disse para o outro:
- Onde tens andado que já há tanto tempo que não te vejo?
- Ora essa, tenho andado a passear. Ainda sou muito novo, tenho tempo de trabalhar. Olha, há dias fui dar um passeio, vi muitas coisas importantes, mas o que gostei mais foi de ter visto uma couve, muito grande, muito grande.
- Olha, eu também há dias fui dar um passeio e estava lá uma feira com muitas coisas a vender, mas o que mais me agradou foi de ter visto uma panela muito grande, muito alta.
Diz o outro assim:
- E para que era essa panela tão grande?
- Pois era para cozer a couve tão grande que tu viste.

Um poema:

Encontro-me alegre e contente
Que ninguém queira saber
Com 68 anos de idade
Eu fui aprender a ler.

Mas quando eu ia para a escola
Muita gente pagodava
Mas eu fiz a minha vida
E a essa gente não ligava.

E porque tinha muita idade
E isso o que tem a ver
Quem tiver fé e vontade
Nunca é tarde para aprender.

[Rita Engrácia (Furnazinhas)]

"A Tia Rita nasceu em 1917. Em criança não pôde frequentar o ensino primário e viu na Educação de Adultos, uma forma de aprender aquilo que ficou para trás e que sempre desejou. Aos 67 anos vai frequentar o curso de Alfabetização da rede pública de Educação de Adultos. Dois anos mais tarde faz a 4ª classe e então pode começar a registar por escrito e a ler as suas poesias, histórias e quadras populares. Há três anos atrás com 89 anos a Tia Rita, passava parte do seu dia num lar, fazia empreita e dizia versos, mantendo-se uma pessoa bastante activa, comunicativa, alegre e sempre disposta a aprender. Espero que continue assim…por muitos anos."

1 comentário:

joca disse...

Infelizmente a tia Rita Engrácia já faleceu...que descanse em paz