2010-10-11

Textos para discussão

Texto 1
No final do século XIX, face às exigências da Industrialização, surgiram na Europa movimentos de renovação pedagógica que defendiam uma educação mais prática. A segunda metade do século XIX foi caracterizada pela consolidação da sociedade burguesa. Foi neste contexto que emergiu o movimento da educação nova, que defendia uma pedagogia activa em oposição aos métodos tradicionais.
Este movimento ocorreu em vários países europeus, nomeadamente na Rússia em 1859, Inglaterra e França em 1899, Alemanha em 1900. Nos EUA, este movimento teve uma orientação definida em torno da pedagogia de J. Dewey que, em 1896, criou e dirigiu em Chicago a primeira escola experimental norte-americana, sob esta orientação.
John Dewey (1859-1952) doutor em filosofia pela Universidade de Baltimore, USA, concebeu a educação como um processo de contínua reconstrução da experiência humana na sociedade. A experiência é entendida como uma actividade humana permanente, um agir e reagir que conduz à reflexão, ao conhecimento e à reconstituição da própria experiência. Assim, vida, experiência e aprendizagem são inseparáveis.
Dewey é o nome mais célebre da corrente filosófica que ficou conhecida como pragmatismo, uma vez que, para essa escola de pensamento, as ideias só tinham importância desde que servissem de instrumento para a resolução de problemas reais. No campo específico da pedagogia, a teoria de Dewey inscreve-se na chamada educação progressiva. Um dos seus principais objectivos é educar a criança como um todo. O que importa é o seu crescimento físico, emocional e intelectual.
A escola deveria estar organizada em volta de experiências práticas, de actividades presentes na vida em sociedade. Ao referir-se às escolas como espaço social, Dewey (1978) cita três características para que esse ambiente possa existir. Primeiro, a escola deve simplificar o ambiente escolar, de maneira que, gradualmente, a criança tenha acesso às artes, às ciências.Em segundo lugar, deve organizar um ambiente afectivo-relacional onde se eliminem aspectos maléficos, ao meio social escolar. A escola não deseja perpetuar na sociedade os seus defeitos. Finalmente, deve criar um ambiente de integração social, de harmonização de conflitos, de uma maior tolerância inteligente e hospitaleira.
A sala de aula deveria ser o lugar em que as experiências podem ser abertamente analisadas e transformadas por meio da cooperação entre alunos e professores. “Aprender a aprender” é um dos seu principais lemas, daí a ênfase em colocar o aluno diante de uma situação problemática que o faça pensar e actuar individualmente em função da resolução do problema, tendo como consequência a aprendizagem. Ao valorizar as experiências, Dewey defende um método de ensino baseado no processo da pesquisa, que deve surgir de uma motivação interior que proporcione o aparecimento de um problema durante uma actividade contínua na qual o aluno esteja interessado. O primeiro objectivo é obter sugestões de solução sendo que a observação e os conhecimentos anteriores devem ser utilizados para analisar a situação problemática e construir a solução provisória.
Outro aspecto igualmente importante para Dewey (1978) diz respeito à imaginação. A imaginação não é uma invenção absolutamente livre da influência do real, mas o reflexo criativo da realidade. Considera ilimitado o alcance da imaginação para apreender as relações entre os factos naturais e os eventos sociais e as suas consequências. O interesse é a base da sua pedagogia, pois o interesse é o que faz a ligação entre a criança e o que ela vai aprender.
Para Dewey se a criança tem interesses, então ela vai se esforçar para conseguir o objecto desse seu interesse, já que estes são sinais e sintomas da capacidade em crescimento. É interessante salientar que o autor coloca no educando a responsabilidade pela sua aprendizagem quando refere que o interesse é pessoal e que o verdadeiro ímpeto para a actividade intelectual, vem de dentro. O mundo do adulto distingue-se do mundo da criança fundamentalmente porque no mundo do adulto “coisas” estão evidentemente mais organizadas e estruturadas. Não é possível, em razão disso, pressupor que a estrutura intelectual da criança seja análoga à do adulto. A capacidade lógica do adulto não deve servir de modelo para se conceber e projectar o mundo da criança, uma vez que ela não dispõe desses atributos formais sem antes passar por um processo de assimilação do mundo. Poder-se-ia dizer que no adulto há processos “finais”, ao passo que na criança há potencialidades em aprimoramento. A escola, entretanto, ignora esse pressuposto. Conforme são dispostas no plano curricular, os conteúdos, por exemplo, indicam uma concepção monolítica de conhecimento, cuja organização é feita de acordo com um “princípio geral”.
Todos esses elementos são contrários ao modelo de Dewey, para quem o processo de distinção de matérias não deve ser feito no sentido lógico do adulto. Assim, juntar todos os conhecimentos conquistados pelo homem e dividi-lo em disciplinas, no intuito de que a criança possa conhecer e compreender o mundo é pressupor que na sua mente o mundo se constrói como se fosse uma “história em quadradinhos. Para Dewey, a educação é um processo social, que não pode ser uma preparação para a vida que há de vir, pois a escola deve representar a vida presente, uma vida tão real e vital para a criança como a que vive em sua casa, na vizinhança ou no campo de jogo.
As ideias de Dewey representaram um progresso em relação às concepções e práticas educativas predominantes no final do século XIX e princípio do século XX. Dewey foi um dos maiores defensores da democracia na segunda metade do século XIX e primeira do século XX, afirmando que é possível pensar numa sociedade melhor se esta primar pela democracia como a única forma digna de vida humana. E não há como defender a democracia, sem defender a educação. Como a democracia é um dos conceitos centrais, Dewey entende que uma sociedade deve procurar fazer com que as oportunidades intelectuais sejam acessíveis a todos os indivíduos. Assim, uma educação democrática é aquela na qual a igualdade de oportunidades é elemento fundamental. Uma educação sem essa igualdade de oportunidades é baseada em privilégios e, portanto, não democrática.

Texto 2

Anton Semionovich Makarenko nasceu em 1888 na Ucrânia, filho de um operário ferroviário e de uma dona de casa. Aprendeu a ler e escrever com a mãe, como a maioria das crianças da época, e logo depois foi matriculado numa escola primária. Lá teve acesso às disciplinas de Língua Russa, mas não pôde estudar a sua língua materna, a ucraniana, proibida pelo império czarista na Rússia, nem Lógica e Filosofia, quee ram disciplinas exclusivas das elites.
Aos 17 anos, Makarenko concluiu o curso de Magistério e entrou em contacto com as ideias revolucionárias de Lenine e Máximo Gorki, que influenciaram a sua visão de mundo e de educação. A sua primeira experiência em sala de aula ocorreu em 1906, na Escola Primária das Oficinas Ferroviárias, onde leccionou durante oito anos. Em seguida assumiu a direcção de uma escola secundária. Mais consciente do modelo de educação que queria aplicar, ampliou o espaço cultural e mudou o currículo com a ajuda de pais e professores e estabeleceu o ensino da língua ucraniana.
A sua experiência mais marcante deu-se de 1920 a 1928, na direcção da Colónia Gorki, instituição rural que atendia crianças e jovens órfãos que haviam vivido na marginalidade. Lá, colocou em prática um ensino que privilegiava a vida em comunidade, a participação da criança na organização da escola, o trabalho e a disciplina. Publicou novelas, peças de teatro e livros sobre educação, sendo o Poema Pedagógico o mais importante. Morreu de ataque cardíaco durante uma viagem de trem em 1939.
Anton Makarenko viveu as grandes transformações históricas do fim do século 19 e do começo do 20, o nascimento das grandes cidades e das suas indústrias, as longas jornadas de trabalho, os movimentos revolucionários contra o império do czar Nicolau II, a Primeira Guerra Mundial e a revolução de Outubro de 1917 que pôs fim à monarquia e instituiu a ditadura do proletariado na União Soviética. Face a tantas mudanças, Makarenko questionava-se sobre que ser humano se deveria formar para viver nesse novo mundo? Makarenko conhecia, na prática, as necessidades da grande massa pobre da Ucrânia, a carência afectiva e material dos filhos dos operários, a audácia dos filhos dos burocratas, que não queriam fazer os trabalhos manuais e intelectuais, tão valorizados na sociedade socialista. Por isso, ele acreditava que a escola tinha que formar seres participativos por meio de uma organização colectiva e democrática, com muita disciplina e trabalho, e os pais que não conseguiam educar os seus filhos deveriam ser reeducados por essa escola.
Makarenko concebeu um modelo de escola baseado na vida em grupo, na autogestão, no trabalho e na disciplina, o que contribuiu para a recuperação de jovens infractores. A sua pedagogia tornou-se conhecida por transformar centenas de crianças e adolescentes marginalizados em cidadãos. O método criado por ele era uma novidade porque organizava a escola como colectividade e levava em conta os sentimentos dos alunos na busca pela felicidade, aliás, um conceito que só teria sentido se fosse para todos. O que importava eram os interesses da comunidade e as crianças tinham privilégios, impensáveis na época, como opinar e discutir as suas necessidades no universo escolar. Mais do que educar, com rigidez e disciplina, Makarenko quis formar personalidades, criar pessoas conscientes do seu papel político, pessoas cultas, sadias e que se tornassem trabalhadores preocupados com o bem-estar do grupo, ou seja que se tornassem pessoas solidárias. Na sociedade socialista de então, o trabalho era considerado essencial para a formação do homem, não apenas um valor económico.
Como a instituição familiar, e tudo o mais na então União Soviética, estava em crise, essa foi a alternativa encontrada pelo educador para proteger a infância do seu país. O sentimento de grupo não era uma ideia abstracta. Tinha raízes nos ideais revolucionários e Makarenko soube como transformá-la em algo concreto. A colónia era auto-suficiente e a sobrevivência de cada um dependia do trabalho de todos. Caso contrário, não haveria comida nem condições de habitação aceitáveis. Para que a vida em comunidade desse certo, era essencial que cada aluno tivesse claras as suas responsabilidades. "Nunca mais ladrões nem mendigos: somos os dirigentes."
Makarenko era conhecido como um educador aberto, mas rígido e duro. Acreditava que o planeamento e o cumprimento das metas estabelecidas por todos só se concretizariam com uma direcção muito firme. Por isso, os alunos tinham consciência de que a disciplina não era um fim, mas um meio para o sucesso da vida na escola. O não cumprimento de uma norma podia ser punido severamente, desde que alunos e professores assim o desejassem, depois de muita discussão. Alguns estudantes moravam nas escolas dirigidas por ele. O educador ucraniano fazia questão da presença dos pais, que eram estimulados a participar de actividades culturais e recreativas.
A escola também tinha o papel de orientar a família, que deveria encará-la como um órgão normativo. Pais ausentes seriam incapazes de educar uma pessoa forte, madura e inteligente. Makarenko queria formar crianças capazes de dirigir a própria vida no presente e a vida do país no futuro. Exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação, excursões, aulas de música e idas ao teatro faziam parte da rotina. A escola tinha que permitir o contacto com a sociedade e com a natureza, ou seja, ser um lugar para o jovem viver a realidade concreta e participar das decisões sociais. Na Colónia Gorki, meninos e meninas eram divididos em grupos de dez, de diferentes faixas etárias. Um representante de cada turma participava nas assembleias e reuniões em que se discutiam as situações da escola: um objecto roubado, a melhoria do prédio, a compra de materiais, a limpeza, os problemas particulares. Sexo e namoro também tinham espaço nas reuniões. Normas e decisões não podiam ser predeterminadas. O primeiro e o último voto eram sempre dos alunos. Makarenko talvez tenha sido o educador que levou às consequências mais radicais as questões do espírito de grupo e do trabalho colectivo. Tudo era discutido entre alunos, professores e a direcção da Colónia Gorki.

Texto 3

Ovide Decroly nasceu em 23 de Julho de 1871 em Renaix (Bélgica) e era filho de um industrial de origem francesa. Os primeiros anos da sua vida foram passados no meio de um grande jardim onde o pai o iniciou nos trabalhos manuais. Era um estudioso das realidades do mundo, foi um naturalista muito expressivo no seu tempo e a influência destas ideologias repercutiram-se na sua actuação profissional. A música e a medicina influenciaram o seu pensamento e a sua personalidade.Em 1896 diplomou-se em medicina na Universidade de Gand, continuou os estudos em Berlim e depois em Paris, onde se especializa em doenças nervosas. Ao regressar à Bélgica em 1901, cria na sua própria casa uma escola para crianças “deficientes”. Em 1907 funda “L’École de l’Hermitage”. Estas iniciativas permitem-lhe viver em contacto directo com os seres a observar, e é com eles que desenvolve e aplica as teorias de globalismo e dos centros de interesse que são os pressupostos psicológicos, com base nos quais, Decroly desenvolve a sua pedagogia. Participou activamente na vida científica. No 1º Congresso Internacional de Calais de 1921, dá o seu contributo para a fundação da Liga Internacional da Educação Nova. Decroly foi um severo crítico da escola do seu tempo e comparava-a a um quartel silencioso e autoritário. Para ele, a educação e a sociedade deveriam estar em interacção constante, devendo a escola ser um prolongamento da vida. O essencial para Decroly era que as crianças aprendessem a aprender e gostassem de aprender. A sua Pedagogia era muito favorecida pela expressão artística. Depois de uma vida dedicada à Educação, morreuu em Bruxelas no ano de 1932.
Decroly sempre se negou a escrever uma obra fundamental que retratasse as suas ideias educacionais, por não considerar concluída a sua concepção educacional; receava que ao publicar as suas técnicas, elas se cristalizassem. Contudo, o método de Decroly foi um dos mais revolucionários da história da pedagogia.Na sua obra fica clara a ideia de liberdade, compreendida como iniciativa e responsabilidade pessoal e social, o respeito à singularidade de cada um, respeitando-se a diferença. Decroly foi sem dúvida um notável educador, psicólogo e médico que em muito contribuiu para a evolução da História da Pedagogia, dando mesmo uma reviravolta no que se fazia na Escola tradicional. Foram muito inovadoras as suas ideias pedagógicas e podem resumir-se da seguinte forma: Ao princípio, a criança aprende as coisas globalmente e só depois atenta nos pormenores. A globalização funciona espontâneamente na criança e permite aquisições importantes como a linguagem, os conhecimentos do meio vivo social entre outros. Decroly evidencia a importância do meio ambiente para o desenvolvimento da criança. O meio estimula a libertação dos interesses. A inter-relação entre a criança e o meio resultam diversos interesses ligados à necessidade de se nutrir, abrigar, proteger e defender dos perigos, necessidade de agir, de se recriar e aperfeiçoar. Assim sendo, o interesse condiciona a adaptação da criança ao meio físico e humano. Os centros de interesse são um processo de ensino que consiste em agrupar à volta de um mesmo tema que interesse à criança, um conjunto de noções a aprender e de hábitos a adquirir. A técnica concentra-se na aquisição de conhecimentos, mas serve também para a educação física, para o despertar do serviço social e para a formação moral. Um interesse, segundo Decroly, proporciona à criança ocasiões de observar, de associar ideias e de as exprimir. A Escola deve constituir um meio natural, um “quadro vivo” para preparar a criança para a vida real. Decroly preocupou-se com as grandes funções psicológicas: observação, associação, expressão, a preferência pelos métodos intuitivos, activos e construtivos e o emprego de jogos educativos. A expressão “Escola Nova” designa a fase da evolução da escola na 1ª metade do séc. XX, onde valoriza o professor e o programa escolar como saber global e o aluno é visto como um suporte de estrutura e de personalidade. Decroly deu um grande contributo. As novas ideias e teorias, métodos e técnicas, marcaram a evolução da escola em três pontos essenciais: A criança como pessoa digna de respeito e atenção; o professor criador de ambiente propício à auto-actividade, auto-educação à globalização, realismo, originalidade e criatividade; do dever ao interesse do aluno crescer livremente e realizar-se em plenitude. Decroly exigiu uma escola “pela vida, para a vida” onde enquadra a criança no seu meio natural, tenta corresponder às exigências da vida, individual e social actuais aproximando a escola da sociedade. O valor de sua obra está no destaque que emprestou às condições do desenvolvimento infantil; a educação, segundo ele, não se constitui na preparação para a vida adulta; a criança deve viver os seus anos jovens e as dificuldades que surgirem em cada fase, para serem resolvidas no momento certo. As crianças para Decroly não podiam ser tratadas como armazenamento de conteúdos, eles só focalizavam o ensino sob um ângulo intelectual. Nas suas escolas ao invés de carteiras separadas, desde os pequeninos, observava-se que os alunos ficavam sempre em grupos. Por exemplo: no campo semeando legumes, de acordo com a estação do ano. Notava-se uma intensa atividade, janelas abertas ao sol, com materiais sempre em renovação. Sobre as mesas, plantas colhidas e fresquinhas, mapas geográficos com características das respectivas regiões. O método de Decroly, mais conhecido pelos centros de interesse, possuíam um destino especial, aos alunos das classes primárias; os conhecimentos e interesses infantis apareciam associados. O maior defeito dos programas é que eles se inspiram em mestres sábios em suas especialidades, mas totalmente incompetentes em matéria de psicologia infantil. Considerando que era fundamental dar a todas as crianças uma cultura geral idêntica, eles não se perguntaram se, dessa forma, seria conveniente às crianças. Para Decroly, a criança deve ser criança e não um adulto em potencial. Ele também transformou a maneira de aprender e ensinar, ajustando a psicologia da criança e em nenhum momento deixou de lado nada que a escola deve ensinar à criança. Os centros de interesse eram aplicados nas diferentes idades: dos três aos seis anos, no jardim de infância, e nos centros surgiram do contato com o meio. O programa de Decroly apresentava idéias associadas: conhecimento pela criança, as suas necessidades de alimentação, de defender-se contra perigos e diversos acidentes, de agir e trabalhar com solidariedade, de ter alegria de espírito. O conhecimento do meio viria para satisfazer as necessidades apontadas acima. Nos centros de interesse, a criança passava por três momentos: o da observação, o da associação e o da expressão. A série de elementos não era obrigatória. Era algo simples para a criança, como comer, daí surgia o estudo da alimentação, a origem e a classificação dos alimentos, os preços, quem os produz e onde, como são preparados. E, de acordo com a curiosidade das crianças e o desenvolvimento, surgirão noções de geografia, ciências, história, higiene, cálculo, redação e desenho. Diante dessa riqueza de possibilidades exploratórias, a duração do centro de interesse é muito flexível, podendo estender-se durante meses. No fim de um dia de trabalho com a pedagogia de Decroly, observamos grandes cadernos dispostos em cada classe sobre pranchetas. Cada aluno coloca o seu trabalho pessoal, documentado e organizado metodicamente as suas observações. Três actividades são aprofundadas, envolvendo a observação, a associação e a expressão.
Para Decroly, a sala de aula está por toda parte, na cozinha, no jardim, no museu, no campo, na oficina, na fazenda, na loja, na excursão, nas viagens...
A observação não ocorre em uma lição, em um momento particular da técnica educativa, mas deve ser considerada como uma atitude, chamando a atenção do aluno todo o tempo. A associação possibilita que o conhecimento adquirido por meio da observação seja compreendido em termos de tempo e de espaço. A expressão possibilitaria ao professor expressar aquilo que ele aprendeu, atenção da linguagem gráfica ou outra qualquer, integrando, assim, os diversos conhecimentos adquiridos.





Texto 4

Celestin Freinet nasceu no sul da França numa família de oito filhos. A sua experiência escolar terá sido profundamente desagradável. Frequentava o Magistério quando ocorre a 1ª Guerra Mundial, o que o obriga a interromper os seus estudos e a alistar-se. Recrutado pelo exército francês, em 1915, teve uma lesão pulmonar causada por gases tóxicos. Esta experiência transformou-o num pacifista convicto. Em 1920 Freinet iniciou o seu trabalho como professor primário, antes mesmo de concluir o curso do Magistério. Foi aí que Freinet começou a desenvolver os seus métodos de ensino. Em 1923 Freinet comprou um tipógrafo, para auxiliar a sua actividade de ensino, já que o seu ferimento do pulmão dificultava que falasse por períodos longos. Foi com este tipógrafo que imprimiu textos livres e jornais da classe para os seus alunos. As próprias crianças compunham os seus trabalhos, discutiam-nos e editavam-nos em pequenos grupos, antes de apresentar o resultado à classe. Os jornais eram trocados com os de outras escolas. Gradualmente os textos do grupo substituíram os livros didácticos convencionais.
Em 1924, Freinet criou uma cooperativa de trabalho com professores de sua aldeia, esta cooperativa suscitou o movimento da Escola Moderna, em França. Neste mesmo ano inicia as primeiras correspondência escolares. Em 1925, conhece a artista plástica Élise, com quem se casa em 1926. Escreve o livro A Imprensa na Escola e cria a revista "La Gerbe" (O Ramalhete) composta de poemas infantis. Os métodos do ensino de Freinet eram divergentes da política oficial de educação nacional e causavam um clima de desconfiança, especialmente devido ao grande volume de correspondências trocadas. Por esta razão, Freinet foi exonerado das suas funções em 1935 e fundou a sua própria escola, junto com a sua esposa, pouco antes do início da 2ª Guerra Mundial.
Na década de 30, a escola de Freinet é oficialmente aberta. Em 1940, Freinet é preso e mandado para o campo de concentração de Var, onde fica gravemente doente. Todavia, mesmo enquanto esteve preso, deu aulas para os companheiros. A sua esposa Elise Freinet, depois de muita luta conseguiu a sua libertação. Logo após sair do campo de concentração, Freinet incorpora a Resistência Francesa. No final da década de 40, Freinet criou o ICEM, Cooperativa do Ensino Leigo que reunia mais de 20 mil pessoas. Em 1956 lançou uma Campanha Nacional para quantificar os alunos nas salas de aula. Lutava por 25 alunos em cada classe.
No que se refere à sua acção pedagógica, Célestin Freinet, era um educador humanista preocupado em desenvolver todo o potencial da criança, procurando aprimorar todas as suas actividades, tendo como concepção o bem-estar e a dignidade da criança como ser humano. Freinet, foi muito além do que se refere a valores ideológicos e até mesmo religiosos, levou em conta a "ética humana". Muitas das palavras ditas por Célestin Freinet ao longo da sua vida vem ao encontro da Declaração Universal dos Direitos das Crianças da ONU.
Quem estuda a Pedagogia Freinet e trabalha com ela diariamente, percebe que se trata muito mais do que uma simples "Proposta Pedagógica", dir-se-ia que é uma "Filosofia de Vida". A criança é vista como um ser autónomo, para a qual é capacitada na escolha das actividades a ser desenvolvidas segundo o seu próprio interesse. É vista também, como um ser racional, capaz de muito cedo opinar e criticar sobre fatos ou assuntos que lhe são expostos, tendo o direito e a oportunidade de raciocinar sobre aquilo que lhe é proposto. Dessa forma, tudo passa a ser mais significativo. O livre arbítrio também é considerado entre as crianças. As suas escolhas e recusas são respeitadas, sempre analisando o motivo de tal decisão. Assim como no adulto, toda criança já possui inerente uma consciência moral, cabe ao educador ajudar a desenvolver e a aprimorar essa moral primitiva. Quem conhece o trabalho da Pedagogia Freinet na prática, pode presenciar a importância dada a um dos direitos do ser humano que é ser respeitado e valorizado. Isto, nada mais é, do que o direito de desenvolver a capacidade criativa e imaginativa que cada um de nós tem dentro de si como seres humanos. Geralmente as crianças que crescem sobre essa pedagogia são mais criativas e ousadas do que outras, que são educadas sem terem os seus direitos humanos respeitados.
Freinet defendia que todo o indivíduo é sócio-político, ou seja, tem a sua parte de responsabilidade na sociedade na qual esta inserida e consequentemente é influenciado politicamente mesmo não querendo. Freinet tinha tanta consciência disso que se envolveu em vários movimentos políticos sendo, por esse motivo, perseguido. Como todo humanista lutava por uma igualdade universal, sempre voltada para a área da educação que era o que realmente lhe interessava e preocupava mais. Nas suas actividades, tentava ensinar aos seus alunos a serem mais solidários através de cooperativas que criava dentro das escolas. Também lutava por uma educação democrática, onde todos tinham voz para opinar, tentando passar o significado de justiça e acima de tudo, procurando ensinar aos seus alunos ser mais humanos.
Célestin Freinet tinha como compromisso, ajudar todos os indivíduos que necessitassem, quer estando envolvidos dentro da escola ou não, preocupando-se em aperfeiçoar e desenvolver as potencialidades de cada um, como ser humano. A sua proposta pedagógica é humanista e liberal, no sentido de educar a criança para ser um homem livre e crítico, apropriando-se da sua vida humana por completo, assimilando a cultura em que vive e a cidadania, primordial para qualquer ser humano. Um dos objectivos da educação na visão de Célestin Freinet, é o alcance da vida humana plena e digna, apropriando-se da cultura e da cidadania. A educação humanista é democrática, pluralista, aberta e crítica, acima de tudo é sensível e atenta às diferenças e necessidades culturais e até mesmo individuais, e é nessa visão que todas as crianças são educadas na pedagogia freinetiana. Ele foi um educador humanista contemporâneo, que tinha como uma das suas metas, humanizar os seus alunos e os seus seguidores, tentando com a sua pedagogia libertar os seus alunos da ignorância, do preconceito, do capricho, da alienação e da falsa consciência, buscando assim, desenvolver as potencialidades humanas de cada um. De forma clássica e humanista, a perfeição humana deveria servir de modelo para regularizar a educação e servir de ideal para todos os seres humanos, em especial os educadores. Para Freinet nenhum indivíduo pode ser considerado educador se não for fiel às suas tradições, sendo crítico e liberal. Na sua pedagogia é necessário praticar-se as virtudes enobrecendo o homem e a sabedoria humana. O exercício das faculdades naturais, a espontaneidade, o interesse pelas coisas naturais, fazem parte da sua filosofia educativa.
Freinet respeitava a essência do homem como ser livre e pensante e caberia aos seus seguidores definirem e criarem situações para o desenvolvimento de cada ser humano, tentando criar verdadeiros autores, indivíduos responsáveis. Os alunos, nessa visão, na qual são educados não são obrigados a aceitar as verdades alheias, mas cabe-lhes, a opção de escolha, dando-lhes oportunidades de criarem as suas próprias identidades e traçarem os seus projectos de vida.
Muitos factos da vida quotidiana afectam directa e indirectamente o desenvolvimento emocional, intelectual, moral e até mesmo físico das crianças, portanto, não se pode negar a relação existente entre a política e a educação. Para que ambas caminhem juntas e bem, seria necessário que a pedagogia se tornasse mais política e que a política se tornasse mais pedagógica. Freinet tinha, também, esse pensamento. Assim sendo, todos os educadores deveriam passar a ter uma visão emancipada sobre todos os problemas sócio-culturais, transmitindo e criando oportunidades para que os seus alunos estivessem capacitados criticamente, tento consciência e auto-controle de suas próprias vidas. Todos os educadores devem lutar colectivamente, assim como Freinet fez na sua época, agindo como sujeitos transformadores, fazendo das escolas um local democrático, com objectivo de ensinar as suas crianças sobre o que é viver em uma sociedade justa, como ser humano, independente da raça, classe, sexo ou idade.
As crianças educadas na Pedagogia de Célestin Freinet, não têm problemas de integração, quer seja em pequenos grupos ou em grandes comunidades; apesar disso tudo elas possuem um senso de individualidade bastante apurado, de autonomia e são bastante autênticas. Os educadores humanistas são vistos pelos seus alunos como um exemplo de vida.
Na escola, deve criar-se um clima de confiança, diálogo, respeito, tolerância, zelo, liberdade, compromisso e responsabilidade. Se algum desses ingredientes vier a faltar, de nada adiantará os ensinamentos deixados pelo saudoso Célestin Freinet.


Texto 5
Jean Jacques Rousseau nasceu em Genebra em 1712. O pai, relojoeiro de profissão, encarregou-se pessoal e directamente da sua primeira instrução. Logo que o pequeno Jean Jacques ficou apto a ler, meteu-lhe nas mãos toda a espécie de livros que o pequeno lia enquanto o pai trabalhava; muitas vezes ficavam ambos tão presos por aquelas leituras que as prolongavam por turnos até quase o romper da aurora. Em 1740, com 28 anos, Rousseau foi para Paris onde conheceu diversos filósofos. Neste período ocupou-se sobretudo de música e escreveu comédias e melodramas. Os contactos com Diderot e outros filósofos despertam-lhe novos interesses. Em 1861 são publicadas as suas obras primas: O Contrato Social e Emílio. Que é que Rousseau se propõe em o Contrato Social? Ele próprio o enuncia claramente: Encontrar uma forma que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada um dos associados por meio da qual cada um, unindo-se a todos os outros, não obedeça senão a si próprio, e fique tão libre como o era dantes.
Para Rousseau tratava-se não tanto de conservar intacta a liberdade natural quanto de a transformar em liberdade civil, com um real enriquecimento e uma ulterior expansão da personalidade. Este enriquecimento é a moralidade, e ao mesmo tempo aquela a que habitualmente chamamos a vida espiritual do homem, já que somente no estado social as suas faculdades se exercitam e se desenvolvem, as suas ideias se alargam, os seus sentimentos se enobrecem, a sua alma se eleva inteira um tal ponto que se, os abusos desta nova condição não o degradassem muitas vezes abaixo daquela donde saiu, ele deveria bendizer sem cessar o instante que lhe fez abandonar para sempre e que, de um animal estúpido e limitado, o transformou num ser inteligente e num homem. O estado social capaz de oferecer tais vantagens não deve, por conseguinte, ser identificado com uma convivência qualquer, mas somente com uma convivência fundada no pacto social e que realize a vontade geral, pois somente assim é possível que cada um seja livre, embora no respeito da lei. Não se trata em Rousseau, de um contrato efectivamente estipulado num determinado momento histórico, e muito menos de um pacto entre soberano e súbditos. Trata-se de uma relação ideal cuja maior ou menor subsistência nos sistemas políticos reais constitui critério de legitimidade destes, i.e., do seu carácter democrático, e trata-se de uma relação que acontece entre cada associado e o complexo de associados, uma vez que para Rousseau o único soberano é o próprio povo. Rousseau tem uma fé quase mística em que o povo chamado directamente a decidir e suficientemente informado da matéria sobre a qual vai deliberar decide sempre bem por uma espécie de “iluminação”.
Em 1861, publicou outra obra prima Emílio. O Emílio é um romance pedagógico constituído por cinco livros que seguem o desenvolvimento do aluno desde o nascimento ao matrimónio e à maternidade. Rousseau no seu romance questiona-se sobre a complexidade de educar o indivíduo a pensar em termos democráticos, i. e., em termos de vontade geral, numa sociedade que não seja já fundada sobre a vontade geral, que não seja democrática. Rousseau defende uma educação fora da sociedade para sociedade, o que parece completamente absurdo. No seu livro, Emílio deve ficar ser educado ficando o maior tempo posível imune a contactos sociais. É necessário criar continuamente à volta de Emílio situações estimulantes, a fim de que, reagindo a elas, se eduque por si. Rousseau distingue três espécies de educação: da natureza, das coisas e a dos homens. Somente o seu harmónico concurso é capaz de fazer com que um indivíduo seja «bem educado». Não obstante isso, a educação dos homens acaba por ser excluída, porque incontrolável e até, na sociedade tal como é, oposta á da natureza. Para formar Emílio que se deve fazer? Muito: impedir que se faça alguma coisa. A maior e mais importante regra para Rousseau «não é ganhar tempo., é perdê-lo». Trata-se de não deixar a criança criar mofo no ócio, mas também de não embaraçar, perturbar, apressar, um processo natural de maturação e de actividades espontâneas, uma educação natural. A natureza humana não se desenvolve senão em experiências empenhativas; o primeiro dever do educador é torná-las possível, desde quase os primeiros movimentos da criança. Rousseau não se cansa de repetir que estas experiências deveriam ser unicamente experiências feitas sobre as coisas, não experiências de relações humanas. Os educadores podem intervir apenas indirectamente, predispondo oportunamente as coisas de modo a preparar aquelas situações que melhor correspondam ás necessidades da criança. Em Rousseau está afastada a ideia de fixar disposições rígidas e mecânicas, a criança deve contrair um único hábito: o de não ter nenhum. A criança é movida, primeiro directamente, depois indirectamente, pelo desejo inato do bem-estar, depois a aprendizagem é fundada sobre a curiosidade, ignorante de todas as coisas que não tenham ligação com tudo o que ele pode julgar útil.


Texto 6

Maria Montessori, nasceu em1870 em Chiaravalle, de uma família conhecida pelo seu fervor religioso. Desde menina que manifestava interesse pelas matérias científicas, principalmente matemática e biologia. Feitos os estudos elementares, entrou em conflito com seus pais, que possuíam o desejo que ela seguisse a carreira de professora, inscrevendo-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Roma. A resolução causou estranheza porque até aí nenhuma mulher ousara cursar a Faculdade. Considerava-se, em toda a Itália, que não eram trabalhos a que se pudessem dedicar as mulheres, sobretudo as que tinham amor de Deus e das coisas sagradas. Maria Montessori suportou todas as oposições, venceu uma a uma, as resistências. Todos os que a conheciam foram louvando a sua inteligência e a sua coragem; havia nela um desejo de ver claramente os problemas, uma ânsia de servir a humanidade, um poder de iniciativa que lhe preparava uma carreira brilhante.
É a primeira mulher a se formar em medicina na Itália, em 1896. Após a sua formatura, iniciou um trabalho com crianças com necessidades especiais na clínica da universidade. Interessavam-lhe sobretudo as doenças do sistema nervoso e concorreu ao internato da clínica de psiquiatria; a pouco e pouco foi-se especializando: as crianças desequilibradas atraíram-lhe a atenção e a piedade, encontrava-as em grande número num hospital de doidos onde ia escolher os seus doentes.
Em 1898, num congresso em Turim, Montessori defendeu a tese de que as pessoas com deficiência precisavam muito menos da medicina do que dum bom método pedagógico. Não se punha, evidentemente, de parte tudo o que fosse tratamento do sistema nervoso, reconstituintes e tónicos, mas assegurava-se que as esperanças de qualquer desenvolvimento estavam no mestre, não no clínico. Era necessário que se criasse à volta do indivíduo um ambiente que o ajudasse, e que os médicos desprezavam, demasiado interessados por uma terapêutica tomada em sentido restrito. Não havia que internar as pessoas com deficiência em casas de saúde e fazê-los desfilar pelas clínicas. Tinham de se construir escolas e tinha de se formar professores, porque, sem bons professores, nada se poderia fazer. Guido Baccelli, que fora professor de Maria Montessori e ocupava então o lugar de ministro da Instrução Pública, interessou-se pela comunicação e chamou-a a Roma para uma série de conferências sobre o ensino de pessoas com deficiência. As conferências despertaram o interesse de todos os que se dedicavam ao assunto e criaram um movimento de opinião a favor das ideias de Montessori.
Toda a vida de Maria Montessori se orientava agora para a educação de crianças com necessidades educativas especiais. Tomava conhecimento de tudo quanto se ia publicando em Itália e no estrangeiro sobre pedagogia, aproveitava todas as sugestões que se lhe afiguravam úteis, prosseguia infatigavelmente as suas experiências com os alunos do internato. Mostrava aos candidatos a professores como a tarefa que empreendiam era das mais nobres que alguém pode tomar sobre si, como a caridade, o espírito de sacrifício, a atenção, o íntimo entusiasmo, o optimismo e o zelo pelo trabalho formam o indispensável fundamento em que vêm assentar os conhecimentos e preceitos. Já desde então lhe surge no espírito o pensamento de que na escola não ganham só os alunos, mas também os mestres, e de que a educação não é, como se julgara até aí, um jogo unilateral: se a escola é boa, a personalidade do mestre deve também enriquecer-se no contacto com o aluno, mesmo que se trate de pessoas com necessidades educativas especiais.
Maria Montessori instruía os mestres, observava os alunos, redigia as suas notas, atendia a consultas, entrava em ligação com todas as pessoas que podiam ajudá-la, manda fabricar material didáctico, cria, ela própria material novo. O esforço físico a que se obrigara prostrou-a por fim, mas as crianças com necessidades educativas especiais que educara, submetidos a exame nas escolas públicas, prestaram provas tão boas como as dos alunos “normais”. Triunfava, mas, no descanso que se impusera, um novo problema a preocupava; como era possível que alunos “anormais” quase batessem os “normais”? Só havia uma explicação. A de que as escolas de “normais” estavam mal organizadas, a de que os métodos eram péssimos e sacrificavam todas as possibilidades que a natureza, generosamente, tinha distribuído à maior parte das crianças, Se assim era (e que dúvida poderia existir?), havia uma tarefa mais importante do que educar as crianças com necessidades educativas especiais, tinha que libertar os milhões de espíritos que implacavelmente as máquinas escolares diminuíam ou esmagavam. A empresa apareceu-lhe como tão grandiosa, a missão como tão bela que teve medo de se entregar por completo ao sonho magnífico. Dominou-se e disciplinou-se, tinha de preparar-se cuidadosamente, antes de se lançar pelo novo caminho que se abria.
Maria Montessori volta a ser estudante e frequenta as aulas de psicologia experimental e de pedagogia; ouvidos os professores de Roma, corre aos de Nápoles e de Milão e fixa o mínimo ensinamento, cuidadosamente o insere no seu próprio sistema, eliminando o que a experiência lhe indica como errado. Visita escolas elementares, questiona os professores sobre os métodos seguidos e resultados obtidos, assiste às aulas, lecciona as classes quando lhe era possível fazê-lo. Pensou em seguir o caminho que tomara com as crianças com necessidades educativas especiais e fez diligência para que se fundasse uma Escola Normal, com classes de experiência, por onde passariam todos os alunos e mestres. As duas tarefas - a da reforma de métodos e a preparação de professores - iriam a par, dando todas as garantias contra a falência por falta de formação do pessoal; a burocracia, porém, que até então se mostrara anormalmente compreensiva e pronta, pôs obstáculos que se revelaram insuperáveis.
Maria Montessori teve, por uns tempos, de se resignar. A ocasião surgiu quando uma empresa italiana que construía prédios para gente pobre pediu-lhe, em 1906, que ajudasse a resolver um problema importante. Os pais dos pequenos que moravam nos prédios iam para o seu emprego muito cedo e quase todo o dia estavam ausentes de casa, o resultado era que as crianças, entregues a si próprias, faziam um barulho insuportável e estragavam o prédio.
Se Maria Montessori quisesse tomar conta do trabalho de as acalmar e entreter, estavam dispostos a ceder-lhe uma sala em cada "bloco" e a pagar-lhe o pessoal necessário. Maria Montessori mediu imediatamente as vantagens excepcionais da oferta: em primeiro lugar não se tratava de escolas, não havendo, portanto, nenhuma espécie de exigências quanto a programas e exames; em segundo lugar, os pais não possuíam a mínima noção de pedagogia e não seriam tentados a intervir no funcionamento da sala; por fim, se o método desse resultado, teria, para a sua difusão imediata e aplicação a todas as escolas elementares, duas qualidades importantes. Era barato e dava resultado mesmo com camadas de população de baixo nível cultural e de deficiente vida material.
Contratada uma professora, elaborou-se o regulamente traçado em linhas muito simples: admitiam-se todas as crianças da casa, desde os 3 aos 7 anos de idade, sem nenhum dispêndio para os pais, que apenas se comprometiam a mandá-las às horas indicadas pela directora, lavadas e com vestidos limpos; a ajudar o pessoal na sua tarefa de educação; a darem à directora as informações que lhes pedissem quanto ao comportamento da criança em casa; a acatarem os conselhos que lhes dessem os professores; os pequenos que se apresentassem sujos ou mal cuidados ou que se mostrassem indisciplinados não poderiam frequentar a sala; por último, excluir-se-iam também aqueles cujos pais faltassem ao respeito ao pessoal da Casa ou de qualquer modo entravassem a acção educativa que se empreendia com a fundação.
A primeira Casa dei Bambini abriu em Janeiro de 1907, com instalações que ficavam muito aquém das que hoje se exigiriam numa escola bem montada, mas que davam à Montessori toda a possibilidade de fazer as suas experiências. Deu tão bons resultados que a empresa resolveu abrir outra; a 7 de Abril, inaugurou-se a segunda, pouco depois uma terceira; as perspectivas eram brilhantes porque a empresa possuía já 400 prédios, e 400 escolas Montessori seriam mais que o bastante para impor o método a toda a Itália e depois ao resto do mundo.
Teresa Bontempi introduziu-as na Suíça. Pouco depois fundou-se uma escola na Argentina e, em 1910, o método penetrou nos Estados Unidos. Em 1911, abriu-se uma escola em Paris e, em 1913, constituiu-se na Inglaterra uma sociedade Montessori. Em 1911, o método Montessori era adoptado nas escolas primárias de Itália. Hoje, os livros de Maria Montessori estão traduzidos em numerosas línguas, entre as quais o chinês e o árabe. Há escolas Montessori em todo o mundo, até no Tibete e no Quénia; na Itália, na Hungria, na Holanda, no Panamá e na Austrália. A sociedade Montessori tem secções em todas as terras civilizadas e funda escolas, organiza conferências, cursos de férias. O movimento amplia-se cada vez mais, embora com todas as modificações que os progressos recentes da pedagogia apresentam como aconselháveis.
O método Montessoriano tem por objectivo a educação da vontade e da atenção, com o qual a criança tem liberdade de escolher o material a ser utilizado, além de proporcionar a cooperação. Os princípios fundamentais do sistema Montessori são: a actividade, a individualidade e a liberdade. Assim, na sala de aula, a criança é livre para agir sobre os objectos sujeitos à sua acção, mas estes já estavam preestabelecidos, como os conjuntos de jogos e outros materiais a utilizar. O material criado por Montessori tem papel preponderante no seu trabalho educativo pois pressupõem a compreensão das coisas a partir delas mesmas, tendo como função a estimular e desenvolver na criança, um impulso interior que se manifesta no trabalho espontâneo do intelecto. Os materiais didácticos consistem em cinco grupos: Exercícios Para a Vida Quotidiana, Material Sensorial, Material de Linguagem, Material de Matemática e Material de Ciências. Estes materiais se constituem de peças sólidas de diversos tamanhos e formas, caixas para abrir, fechar e encaixar; botões para abotoar; série de cores, de tamanhos, de formas e espessuras diferentes, colecções de superfícies de diferentes texturas e campainhas com diferentes sons. O "Material Dourado" é um dos materiais criado por Montessori. Este material baseia-se nas regras do sistema de numeração, inclusive para o trabalho com múltiplos, sendo confeccionado em madeira, é composto por: cubos, placas, barras e cubinhos. O cubo é formado por dez placas, a placa por dez barras e a barra por dez cubinhos. Este material é de grande importância na numeração, e facilita a aprendizagem dos algoritmos e das operações matemáticas. O "Material Dourado" desperta no aluno a concentração, o interesse, além de desenvolver sua inteligência e imaginação criadora, pois a criança, está sempre predisposta ao jogo. Além disso, permite o estabelecimento de relações de graduação e de proporções, e finalmente, ajuda a contar e a calcular. O aluno usa (individualmente) os materiais à medida de sua necessidade e por ser autocorrectivo, faz sua auto-avaliação. Os professores são auxiliares de aprendizagem e o sistema peca pelo individualismo, embora, hoje, a sua utilização seja feita em grupo.No trabalho com esses materiais a concentração é um factor importante. As tarefas são precedidas por uma intensa preparação, e, quando terminam, a criança se solta, feliz com sua concentração, comunicando-se então com seus semelhantes, num processo de socialização. A livre escolha das actividades pela criança é outro aspecto fundamental para que exista a concentração e para que a actividade seja formadora e imaginativa. Essa escolha realiza-se com ordem, disciplina e com um relativo silêncio.
O silêncio também desempenha um papel preponderante. A criança fala quando o trabalho assim o exige, a professora não precisa falar alto. Pés e mãos têm grande destaque nos exercícios sensoriais (não se restringem apenas aos sentidos), fornecendo oportunidade às crianças de manipular os objectos, sendo que a coordenação se desenvolve com o movimento.
Em relação à leitura e escrita, na escola montessoriana, as crianças conhecem as letras e são introduzidas na análise das palavras e letras. Estando a mão treinada e reconhecendo as letras, a criança pode escrever palavras e orações inteiras. Em relação à matemática, os materiais permitem o reconhecimento das formas básicas, permitem o estabelecimento de graduações e proporções, comparações, induzem a contar e calcular.
Doze pontos do Método Montessori
1.Baseia-se em anos de observação da natureza da criança por parte de vários pedagogos.
2.Demonstrou ter uma aplicabilidade universal.
3.Revelou que a criança pequena pode ser um amante do trabalho, do trabalho intelectual, escolhido de forma espontânea, e assim, realizado com muita alegria.
4.Baseia-se em uma necessidade vital para a criança que é a de aprender fazendo. Em cada etapa do crescimento mental da criança são proporcionadas actividades correspondentes com as quais se desenvolvem suas faculdades.
5.Ainda que ofereça à criança uma grande espontaneidade consegue capacitá-la para alcançar os mesmos níveis, ou até mesmo níveis superiores de sucesso escolar, que os alcançados sobre os sistemas antigos.
6.Consegue uma excelente disciplina apesar de prescindir de coerções tais como recompensas e castigos. Explica-se tal facto por tratar-se de uma disciplina que tem origem dentro da própria criança e não imposta de fora.
7.Baseia-se em um grande respeito pela personalidade da criança, concedendo-lhe espaço para crescer em uma independência biológica, permitindo-se à criança uma grande margem de liberdade que se constitui no fundamento de uma disciplina real.
8.Permite ao professor tratar cada criança individualmente em cada matéria, e assim, fazê-lo de acordo com suas necessidades individuais.
9.Cada criança trabalha ao seu próprio ritmo.
10.Não necessita desenvolver o espírito de competição e a cada momento procura oferecer às crianças muitas oportunidades para ajuda mútua o que é feito com grande prazer e alegria.
11.Já que a criança trabalha partindo da sua livre escolha, sem coerções e sem necessidade de competir, não sente as tensões, os sentimentos de inferioridade e outras experiências capazes de deixar marcas no decorrer de sua vida.
12.O método Montessori propõe-se desenvolver a totalidade da personalidade da criança e não somente suas capacidades intelectuais. Preocupa-se também com as capacidades de iniciativa, de deliberação e de escolhas independentes e os componentes emocionais.


Texto 7

Ivan Illich nasceu em Viena no ano de 1926 e faleceu em Bremen, na Alemanha em Dezembro de 2002. Filho de pai jugoslavo e mãe com ascendência judia, teve de abandonar a Áustria quando tinha cinco anos. A família mudou-se para Roma, onde Illich completou os seus estudos de física (Florença), filosofia e teologia (Roma) e doutoramento em História (Salzburgo). Durante a infância e juventude conviveu com o círculo de nobres russos que se refugiaram na capital italiana depois de terem saído do seu país aquando da revolução comunista de 1917. Foi também em Roma que Illich entrou para o seminário (1951), onde teve como colegas muitos dos futuros diplomatas do Vaticano e onde se ordenou sacerdote. Nos anos 60 mudou-se para o México onde criou o Centro Intercultural de Formação (CIF), com o objectivo de sensibilizar missionários para trabalhar na América Latina. Na década de 70 foi co-fundador do Centro de Informação e Documentação (CIDOC), espécie de universidade aberta, especialmente voltada para os problemas da educação e independência cultural do Terceiro Mundo, sobretudo da América Latina. A partir de 1980, dividiu o seu tempo entre o México, os Estados Unidos e a Alemanha. Nos últimos anos da sua vida, Illich foi professor convidado de filosofia, de ciência, tecnologia e sociedade no estado da Pensilvânia, sendo também docente na Universidade de Bremen, cidade onde morreu no dia 2 de Dezembro de 2002. Illich é autor de várias obras, algumas traduzidas em 25 línguas. Nos seus numerosos escritos Illich contesta muitas das instituições e estruturas sociais existentes. Ivan Illich faz uma análise crítica das instituições educativas e das suas características e propõe a criação de um sistema alternativo que substitua a figura da escola por um espaço de uma aprendizagem não enquadrado institucionalmente. Segundo Illich, o sistema educativo converteu-se num sistema burocrático, hierarquizado e manipulador, tendo como função primordial a reprodução e o controlo das relações económicas. Por toda a parte, o aluno é levado a acreditar que só um aumento de produção é capaz de conduzir a uma vida melhor. Deste modo se instala o hábito do consumo dos bens e dos serviços, que nega a expressão individual, que aliena, que leva a reconhecer as classes e as hierarquias impostas pelas instituições. Os alunos estão sujeitos a currículos extensos e repetitivos, dados de forma demasiado rápida e superficial. Os professores, já habituados a esta rotina, não dão a possibilidade de aprofundar um ou outro tema que mais interesse os alunos, nem são capazes de atender às necessidades específicas de cada aluno. A escola passa assim a ser um local de desigualdades e de conflitos, uma vez que alguns se adaptarão melhor do que outros. Segundo Illich, o facto de a escolaridade ser obrigatória só agrava a situação. Aqueles que não se conseguem adaptar aos temas curriculares obrigatórios e aos métodos de ensino vigentes, arrastam-se durante anos na escola, nada aprendem de válido, perdendo sua auto-estima. Quando finalmente deixam a escola, os alunos não estão preparados para ingressar no mundo do trabalho.
Assim, a sociedade depara-se com jovens desanimados e desapontados, sem grandes perspectivas de futuro. Caso os alunos decidam abandonar a escola antes de terminarem a escolaridade obrigatória, confrontam-se com problemas ainda mais graves, porque se, com a escolaridade mínima ainda têm a possibilidade de arranjar emprego mesmo sem formação específica, sem certificação escolar, o emprego torna-se quase impossível, ou então, sujeitam-se a empregos maus e mal remunerados. Illich defende que, apesar de muitas pessoas terem já consciência da ineficácia e da injustiça presente no sistema educativo moderno, não são ainda capazes de imaginar alternativas nem de conceber uma sociedade desescolarizada. Daí que se torne necessário criar entre as pessoas e aquilo que as rodeia novas relações que sejam fontes de educação, no sentido de mudarem a ideia que fazem de desenvolvimento e de modificaram os estilos de vida quotidiana.
Em alternativa ao actual sistema educativo, Illich propõe a criação de novas instituições educativas, que permitam dar àquele que quer aprender novos meios de entrar em contacto com o mundo à sua volta. A criação de novas instituições educativas propostas por Illich, teria como objectivos principais, permitir, a todos aqueles que pretendem aprender, o acesso aos recursos existentes, em qualquer idade, facilitar o encontro entre aqueles que desejam comunicar os seus conhecimentos e toda e qualquer pessoa que deseje adquiri-los e, também, permitir aos portadores de ideias novas que se façam ouvir. Segundo Illich, as novas instituições educativas deveriam permitir a qualquer aluno o livre acesso a toda a informação e a todo o conhecimento que pretendesse adquirir. Em oposição aos actuais programas escolares obrigatórios supervisionados pelas instituições, o aluno não deveria ter necessidade de apresentar quaisquer credenciais ou currículo anterior para lhe ser facultado esse acesso. Para Illicha, essas novas instituições permitiriam a todas as pessoas a possibilidade de comunicarem os seus conhecimentos, tornando-os acessíveis e disponíveis a todos os interessados, com vista a aumentar e a multiplicar as oportunidades quer de aprender, quer de ensinar. Segundo Illich, tratava-se de substituir a pergunta: «O que é necessário que se aprenda?», por «Com que espécie de coisas e de pessoas deve estar relacionado aquele que deseja aprender?». A função das novas instituições educativas seria criar redes disponíveis e acessíveis a todos, um serviço encarregue de pôr à disposição do público os objectos educativos, isto é, os instrumentos, as máquinas e os aparelhos utilizados para a educação formal, um serviço de troca de conhecimentos, uma lista actualizada de pessoas desejosas de “mostrar” as suas competências, para que outros as aproveitassem, mencionando as condições em que desejariam fazê-lo, um organismo que facilitaria os encontros entre pares. Existiria uma verdadeira rede de comunicações que registaria a lista das pretensões em matéria de educação daqueles que se lhe dirigissem para encontrar um companheiro de trabalho ou de pesquisa. Existiriam serviços de referência em matéria de educadores, o que iria permitir estabelecer uma espécie de anuário onde se encontrassem os endereços dessas pessoas, profissionais ou amadores, que podiam fazer ou não parte de qualquer organismo.
Segundo Illich, os objectos materiais constituem um recurso educativo fundamental. O autor enfatiza a importância da utilização e manipulação, quer dos objectos que são concebidos numa perspectiva puramente educativa, quer dos que fazem parte da vida quotidiana. Para permitir o acesso a estes bens materiais, os objectos concebidos com um fim educativo, seriam apresentados em bibliotecas, laboratórios, salas de exposição (museus e salas de espectáculo, por exemplo). Os outros, utilizados na vida quotidiana, em fábricas, aeroportos, quintas, etc., poderiam ser acessíveis às pessoas que desejassem conhecê-los, durante um período de aprendizagem ou fora das horas de trabalho. Na opinião do autor, as pessoas encontram-se, cada vez mais, afastadas da natureza real dos objectos concebidos pela sociedade, uma vez que desconhecem a constituição e o funcionamento da maioria dos produtos, criados pela indústria, que utilizam no dia a dia. As pessoas vivem num meio que elas próprias conceberam e esse ambiente artificial vai tornando-se tão impenetrável como a natureza o era para os povosprimitivos. No que respeita aos objectos concebidos com uma finalidade puramente educativa, como é o caso dos manuais escolares, livros, microscópios, computadores, etc., o autor considera que o acesso a estes bens materiais é também fortemente condicionado em termos de horários de acesso e de qualificações exigidas aos utilizadores. Sob o pretexto da sua conservação e protecção, o acesso aos mesmos é reduzido, retirando-lhes o seu potencial educativo. É etiquetando todas as coisas, fazendo delas utensílios educativos, que a escola lhes faz perder a sua virtude viva. Illich propõe assim uma alteração das condições de acesso e utilização desses objectos, de modo a tornar acessíveis o meio físico e os recursos materiais próprios para a educação, devolvendo-lhes o seu valor educativo.
Segundo Illich, nas cidades modernas, o facto de as pessoas e, sobretudo as crianças, serem mantidas longe dos centros de actividades (fábricas, indústrias, etc.), sob o pretexto de que são privadas ou públicas, mas não abertas ao público, impede o conhecimento e a compreensão dos métodos de produção. Neste sentido, acusa igualmente as empresas, bem como as entidades ligadas à investigação científica, de quererem, para o seu interesse económico, manter a exclusividade no que respeita a conhecimentos técnicos e científicos, métodos e bens de produção, impedindo por isso a sua divulgação e impossibilitando a partilha de conhecimentos. Assim, o autor defende o reconhecimento do valor educativo destes centros de actividade e que deveria haver total permissão de acesso às respectivas instalações. Illich defende a existência de um serviço de troca de conhecimentos cuja função seria permitir o encontro e a reunião de pessoas que queiram transmitir/receber um conhecimento específico. Essa troca, segundo o autor, seria baseada na demonstração directa por parte de quem pretende transmitir determinados conhecimentos. São referidos exemplos como a aprendizagem de línguas, a culinária, a condução, etc. Ao constatar o desaproveitamento de muitas das pessoas capazes de demonstrar determinado conhecimento, Illich manifesta-se contra a exigência de diplomas e currículos aos educadores. Os diplomas representam um obstáculo à liberdade da educação, fazendo do direito de partilhar os seus conhecimentos um privilégio reservado aos empregados das escolas. Considera ainda desprovido de sentido esperar que os educadores inspirem o gosto de aprender nos alunos, já que acredita que esse interesse existe em cada um. A instrução tem de partir de uma escolha pessoal. Segundo Illich não existe partilha de conhecimentos técnicos por parte do profissional moderno, pois a especialização e o monopólio da informação são tidos como uma vantagem competitiva em relação aos demais. Illich defende, por isso, a criação de centros abertos ao público, em particular nas zonas industriais, que forneçam certas habilitações: saber ler, escrever, aprender línguas estrangeiras, conhecer a programação, compreender circuitos eléctricos, opera com máquinas, etc. Propõe ainda um sistema em que aquele que adquira determinados conhecimentos nestes centros, se dedique posteriormente à sua demonstração. Para tal, existiriam organismos e centros de informação encarregues de estabelecer e difundir as listas dos educadores voluntários e dos educandos interessados, e, um conjunto de informações sobre ambos. Surgiria uma outra instituição em vez da escola, inteiramente nova, constituída por aqueles que teriam ganho a sua educação partilhando-a com os outros. Na perspectiva do autor, os exames curriculares utilizados como critério de escolha pelos empregadores, deveriam ser substituídos por provas práticas de competência, baseadas na demonstração dos conhecimentos. Desta forma, a selecção do profissional seria não só mais justa, como também mais eficiente e vantajosa para o empregador, em oposição, a uma escolha baseada num currículo educativo. Illich defendia a ideia de que um autêntico sistema educativo deveria permitir a cada um escolher qualquer actividade, para a qual procuraria um par da sua força. O termo “pares” refere-se a pessoas que, partilhando interesses e aptidões comparáveis, decidem realizar juntas a sua pesquisa, ou que se unem para se exercitar na prática de uma actividade partilhada. Esta definição inclui conjuntos de pessoas interessadas em actividades tão diversas quanto comentar livros ou artigos, praticar determinados jogos, realizar excursões, partilhar conhecimentos de mecânica, ou quaisquer outras actividades. Para permitir a aproximação e o encontro daqueles que, num dado instante, partilham um mesmo interesse específico, o autor propõe a organização de reuniões entre crianças desde a mais tenra idade, como forma de incentivar a descoberta e partilha de interesses comuns. Propõe ainda a criação de um sistema, ou rede de comunicação apoiada numa base de dados informática, onde cada utente procederia a uma inscrição indicando o seu nome, morada e actividade para a qual pretendesse companheiro(s). As respostas à respectiva solicitação seriam dadas através do correio ou, nas grandes cidades, através de terminais informáticos. Uma tal rede, dispondo de recursos públicos, seria o único meio de garantir o direito de livre reunião e de preparar os cidadãos para esta actividade fundamental. O direito de reunião livre de pessoas, apesar de ser reconhecido legal e politicamente, é desrespeitado sempre que a lei impõe determinadas formas de agrupamento de que é exemplo a Escola. Desescolarizar passa então pela abolição dessa obrigatoriedade, ao mesmo tempo que pelo reconhecimento do direito à participação de qualquer pessoa numa reunião de pares, independentemente da idade ou do sexo. Os edifícios escolares seriam reconvertidos em pontos de encontro de acesso livre para as reuniões de pares, criando-se assim um espaço privilegiado para a troca de ideias. Illich ressalva características que considera compensatórias, como a possibilidade de participação em vários grupos de pares e de reunião de pessoas de diferentes pontos geográficos capazes de permitir a partilha de experiências de vida muito diferentes. Segundo Illich, este sistema de comunicação poderia dar origem ao aparecimento de comunidades, ou seja, ao desenvolvimento da vida comunitária à escala local, em muitos casos desaparecida. A rede de comunicações permitiria ainda aos cidadãos uma maior independência das instituições públicas, bem como uma perspectiva mais crítica e livre relativamente aos profissionais creditados que lhes prestam os serviços, cuja competência não pode, de outra forma, ser aferida. A troca de informação através das redes de comunicação, permitiria ao estudante escolher o seu professor, ao doente conhecer o seu médico, etc. A ideia base é a de que se os cidadãos dispusessem de possibilidades de escolha da sua instrução, aumentaria a procura de especialistas nas áreas do seu interesse. Desta forma, a desescolarização da educação contribuiria para dinamizar a procura de indivíduos possuidores de uma competência prática, assegurando a sua independência e, logo, a sua credibilidade. Illich distingue três tipos distintos de competências educativas necessárias ao funcionamento das redes: administradores educativos - encarregues de pôr em funcionamento as redes, ou seja, de garantir a eficiência e permanência das vias de acesso aos serviços administrativos; conselheiros pedagogos - responsáveis por guiar estudantes e pais na utilização das redes, isto é, auxiliar a encontrar o caminho mais apropriado para atingir os respectivos objectivos; iniciador educativo - mestre ou verdadeiro guia, encarregue de auxiliar nos caminhos da exploração intelectual. As duas primeiras são consideradas como verdadeiras profissões educacionais, que visam facilitar os encontros entre as pessoas desejosas de aprender e aqueles que possam servir-lhes de orientação, permitindo-lhes o acesso aos objectos educativos. Quanto ao iniciador educativo, ser-lhe-ia exigida disciplina intelectual, imaginação, criatividade e vontade de se associar a outras pessoas para as esclarecer. Neste último caso, estabelecer-se-ia uma relação de mútua estima entre mestre e discípulo, de onde ambos retirariam prazer, o que beneficiaria, em muito, a aprendizagem. Neste sentido, o iniciador educativo tornar-se-ia numa espécie de pedagogo, uma vez que, ao contrário do professor tradicional, teria o poder de agir fora da escola, sobre a sociedade inteira. Em suma, para Illich, a defesa do direito de livre acesso aos instrumentos de ensino e do direito de partilhar conhecimentos e crenças com outros, pressupunha uma revolução educativa que tornasse livre o acesso às coisas, abolindo o controle que as entidades particulares e as instituições exercem sobre o seu valor educativo, tornasse livre a partilha das aptidões, garantindo o direito de as ensinar ou de as demonstrar a pedido, tornasse livre os recursos criadores e críticos dos seres humanos, restituindo a todo o indivíduo o poder de convocar reuniões ou de participar nelas e, finalmente, que libertasse os indivíduos da obrigação de limitar os seus projectos de vida a instituições que lhes podem “garantir” profissões previamente estabelecidas.

1 comentário:

Anónimo disse...

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